Medos na Infância e Adolescência – do normal ao patológico

Autor: Maria Sousa Ferreira, Mafalda Oliveira

Última atualização: 2017/04/07

Palavras-chave: Criança, Adolescente, Medo, Perturbação da Ansiedade, Fobia



Resumo


O medo faz parte do desenvolvimento normal de qualquer criança ou adolescente. É uma resposta emocional a um acontecimento, real ou imaginário, interpretado como ameaçador e traduz-se por um “estado de alerta”, que pode ser benéfico para agir em situações de perigo.
É considerado patológico quando se associa a ansiedade ou sensação intensa e duradoura de preocupação, influenciando as atividades diárias da criança ou adolescente. Neste caso, poderá existir uma Perturbação da Ansiedade, que representa a perturbação psiquiátrica mais frequente em idade pediátrica. Todas as crianças sentem medo, mas cerca de 10 a 30 % podem desenvolver este tipo de Perturbação.
A distinção entre medo “normal” e medo “patológico” é muito importante para evitar a sua interferência no desenvolvimento normal da criança e repercussões na vida adulta.




Medo “normal”


De uma forma geral, sabe-se que as crianças são particularmente suscetíveis a apreenderem os medos dos seus pais/cuidadores. As meninas relatam mais frequentemente os seus medos do que os meninos e, quase todas as crianças, exibem uma reação de evitamento face ao objeto ou situação temida.
Os pais/cuidadores adotam, muitas vezes, posições extremas. Por um lado, desvalorizam a situação, interpretando-a como normal e passageira, independentemente do grau de sofrimento associado. No outro extremo, reforçam a importância do medo, contribuindo para a sua amplificação e manutenção.
O alvo do medo geralmente varia de acordo com a etapa do desenvolvimento. No quadro abaixo identificam-se alguns medos considerados normais na infância e na adolescência. São passageiros e sem repercussão importante na vida pessoal, familiar e sócio-cultural, surgindo e desaparecendo de acordo com o crescimento.

Medos considerados normais de acordo com a idade da criança/adolescente
0-6 meses Perda de apoio; Quedas; Barulhos intensos
7-12 meses Estranhos; Separação
1 ano Estranhos; Separação; Casa de banho
2 anos Separação; Barulhos estranhos; Animais; Escuro; Mudança ambiental; Objetos grandes
3 anos Separação; Barulhos estranhos; Escuro; Máscaras
4-5 anos Separação; Animais; Lesões corporais
6 anos Seres sobrenaturais; Lesões corporais; Escuro; Estar sozinho; Trovoada
7-8 anos Seres sobrenaturais; Lesões corporais; Escuro; Estar sozinho; Ladrões
9-12 anos Desempenho escolar; Lesões corporais; Aparência física; Trovoada; Escuro; Morte; Futuro
13-18 anos Falha social; Sexualidade



Medo “patológico”


Existem medos que poderão traduzir a presença de patologia, sendo importante identificá-los. São caracterizados por:

  • Medo intenso
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  • Preocupação e ansiedade persistentes (duração superior a 6 meses)
  • Medo invasivo (Exemplo: medo que interfere com a alimentação, o sono, as atividades diárias, o desenvolvimento psicológico e/ou funcional)
  • O objeto ou situação temidos são ativamente evitados ou enfrentados com grande angústia
  • Medo desproporcional ao risco real
  • Medo associado a temas bizarros (Exemplo: medo de cheirar mal, medo de engolir brinquedos)
  • Medo que não corresponde à idade cronológica
  • Medo que não cede a manobras de distração ou tranquilização
  • Medo que se associa a:
    • Trémulo, batimentos cardíacos acelerados, dificuldade respiratória, tonturas
    • Irritabilidade ou choro inconsolável
    • Comportamentos regressivos/imaturos (Exemplo: criança que volta a usar a chupeta depois de a ter deixado durante um longo período de tempo)
    • Grande suscetibilidade a críticas
    • Comportamentos obsessivos e/ou compulsivos (Exemplo: criança com necessidade de verificar, de forma repetitiva, se as portas ou janelas estão fechadas, sempre que entra numa divisão da casa)


É importante ter presente que quanto mais marcada a interferência do medo na vida da criança ou adolescente e o grau de ansiedade associado, mais provável será a sua duração ao longo do tempo, com possível repercussão na vida adulta.

Saber lidar com o medo


A abordagem do medo “patológico” tem como objetivo principal ajudar a criança a encontrar formas positivas para superá-lo. Passa pela tranquilização, firme e segura; pela educação e explicação acerca do medo; e por estratégias para o desconstruir, como sejam jogos que incluam o alvo do medo.
A educação parental é fundamental e inclui as seguintes atitudes:

  • Valorizar adequadamente o medo e a reação da criança/adolescente;
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  • Incentivar a formulação de soluções para enfrentar o objeto/situação temida (Exemplo: elaborar uma história engraçada sobre o monstro temido ou na qual a criança consegue superar o seu medo, mostrando-a como corajosa) ;
  • Não favorecer o evitamento excessivo, mas também não forçar para além da capacidade de adaptação;
  • Evitar atitudes intensificadoras do medo, como sejam, a indiferença, a hiperproteção, a ironia, a humilhação e as expectativas irrealistas;
  • Utilizar demonstrações concretas (Exemplo: mostrar a uma criança com medo de monstros ou fantasmas que não existe nada debaixo da cama, nem dentro do armário)
  • Esclarecimento de dúvidas (Exemplo: explicar que existem alguns barulhos que só são percebidos em ambientes silenciosos, como é o caso do som dos ponteiros do relógio e que isso é normal e não é preciso ter medo)
  • Introdução gradual do objeto/situação temida, com o apoio dos pais/cuidadores.



Quando procurar ajuda?


É aconselhável procurar ajuda médica, nas seguintes situações:

  • Dificuldade em adotar as estratégias propostas;
  • Persistência da situação (duração superior a 6 meses);
  • Presença de sintomas perturbadores das funções biológicas, como alimentação e/ou sono;
  • Presença de sintomas invasivos do quotidiano da criança;
  • Presença de sintomas causadores de sofrimento intenso.



Conclusão


Os medos são comuns e muitas vezes não têm significado de maior.
É fundamental uma abordagem integrada, entre pais/cuidadores e profissionais de saúde, adequada e atempada, que permita a resolução do medo, de modo a permitir um desenvolvimento saudável e feliz.

Referências recomendadas



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