Autor: Vera Lúcia Teixeira, Nídia Ramos, Mónica Silveira
Última atualização: 2018/12/14
Palavras-chave: Alergia e Imunologia; Anafilaxia; Hipersensibilidade Alimentar
ÍndiceResumoA alimentação desempenha um papel fundamental na saúde e representa o pilar terapêutico de muitas doenças. A alergia alimentar afeta cerca de 8 em cada 100 crianças. Nos adultos, apesar da prevalência ser mais baixa, tem vindo a aumentar o número de casos de reações graves. A alergia alimentar é das poucas situações em que uma falha na dieta pode condicionar um risco de saúde imediato e potencialmente fatal. |
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A alergia é uma resposta excessiva do sistema imunológico que ocorre quando este reconhece erradamente um alimento como uma entidade agressora ao organismo. A fração desse alimento que é responsável pela reação alérgica denomina-se alergénio. Quando expostos aos alergénios, os doentes sensibilizam-se e passam a manifestar sintomas sempre que contactam com estas substâncias.
O aparecimento de reações relativas a uma alergia ocorre, habitualmente, poucos minutos até 2 horas após a ingestão dos alimentos. Os sintomas podem variar de moderados a graves, podendo mesmo, em alguns casos, ser fatais. Estas reações podem atingir a pele e as mucosas, as vias respiratórias, o sistema gastrointestinal ou o cardiovascular, de uma forma isolada ou combinada.
Os sintomas habitualmente decorrem da ingestão do alimento. Porém, a inalação ou o contacto cutâneo com os alergénios também pode desencadear sintomas.
As manifestações clínicas da alergia alimentar variam com a idade. Na infância, a forma de apresentação mais comum é o eczema atópico: reação retardada mais difícil de diagnosticar, porque decorre muito tempo entre a ingestão e a ocorrência dos sintomas. No adulto, as reações imediatas são as mais frequentes.
Erupções cutâneas Eczema (vermelhidão) Edema (inchaço) dos lábios e da língua Sensação de formigueiro na boca e na garganta |
Dificuldade em respirar |
Diarreia Vómitos |
Perda de consciência |
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Os alimentos mais frequentemente implicados, responsáveis por cerca de 90% das reações alérgicas, são o leite de vaca, o ovo, os frutos de casca rija (frutos secos), o amendoim, os peixes, o marisco, o trigo e a soja. Contudo, qualquer alimento poderá ser responsável por uma alergia alimentar. Saber ler e interpretar os rótulos alimentares é fundamental, no sentido de identificar alergénios potencialmente ocultos.
Embora com menos frequência, alguns indivíduos são alérgicos a mais do que um alimento e, noutros casos, para além dos alimentos diretamente envolvidos nas reações alérgicas, ocorrem manifestações perante a exposição a outros alergénios. Este fenómeno designa-se reatividade cruzada.
O mecanismo de reatividade cruzada é explicado pela semelhança estrutural de algumas proteínas. O mais frequente é a associação de alergia respiratória (aos pólenes) e alergia alimentar a frutos (como o pêssego, kiwi, ameixa, pêra, tomate, melão, banana, cereja, pepino, cenoura, amêndoa ou avelã). Outros exemplos são a alergia ao marisco (camarão) que está associada à alergia aos ácaros ou a alergia a pólen de gramíneas que pode estar associada à sensibilização ao tomate.
Existem casos em que a relação causal dos sintomas e a ingestão de determinado alimento é evidente. No entanto, noutras situações, esta relação não é clara. É importante investigar fatores como o estado em que o alimento é ingerido: fresco, congelado, cozinhado ou processado industrialmente, se houve ingestão concomitante de outros produtos ou, ainda, a existência de cofatores que podem potenciar a ocorrência de reação alérgica alimentar: exercício físico, imediatamente antes ou após a refeição; toma concomitante de medicamentos (como aspirina e outros anti-inflamatórios não esteroides, bloqueadores beta e outros antihipertensores; …).
O preenchimento de um diário alimentar completo, bem como a descrição das atividades diárias pode ser essencial para o diagnóstico.
Após a identificação dos alimentos envolvidos são efetuados testes cutâneos de alergia e/ou determinações de IgE específicas no sangue.
Para o estabelecimento do diagnóstico definitivo poderá ser necessária a realização da prova de provocação oral, que consiste na ingestão de quantidades crescentes do alimento suspeito, em ambiente medicamente controlado.
As reações anafiláticas, embora raras, constituem a forma mais grave de reação alérgica. A anafilaxia é uma manifestação alérgica que se desencadeia de forma rápida e envolve dois ou mais órgãos e sistemas, incluindo o cardiovascular. Se não tratada de forma imediata e adequada (com dispositivo injetável de adrenalina intramuscular e medicação anti-histamínica), coloca em risco a vida. Para além dos familiares, todos aqueles que contactam diariamente com o doente devem ter conhecimento do seu problema, estando familiarizados com o plano de emergência. O ensino da administração de adrenalina deverá ser realizado na escola, no local de trabalho ou outros locais que o doente frequente.
A maioria das alergias alimentares resolve-se espontaneamente até à idade escolar. Se a alergia alimentar surge em idade adulta é menos provável o seu desaparecimento.
O tratamento consiste na eliminação do alergénio da alimentação: evicção alimentar dos alimentos responsáveis pela ocorrência dos sintomas. Trata-se de um processo complexo, exigindo a implementação de diversas estratégias no plano pessoal, familiar e social.
Para o tratamento de episódios agudos, ou após ingestão acidental do alergénio, o doente deve transportar consigo medicamentos como anti-histamínicos, broncodilatadores e corticóides.
Para garantir que a ingestão de nutrientes não fica comprometida, como consequência da evicção alimentar, devem ser consumidos outros alimentos nutricionalmente equivalentes, que não contenham o alergénio.
As alergias alimentares são comuns e podem ser muito graves. Para prevenir uma reação alérgica é necessária restrição. A leitura e interpretação de rótulos alimentares é fundamental, no sentido de identificar alergénios potencialmente ocultos.
O escudo protetor das alergias é a informação.