Autor: Ana Sofia Pires; Ana Vera Costa; Sara Pinto; Marta Vila-Real; Fátima Santos
Última atualização: 2021/02/26
Palavras-chave: Tiques; criança; criança (pré-escolar); adolescente
ÍndiceResumoOs tiques são comuns nas crianças em qualquer fase do desenvolvimento. Existem múltiplos tipos de tiques diferentes e uma criança pode ter uma expressão variada no que toca a localização, frequência e intensidade ao longo da vida. |
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Tiques são uma entidade benigna, caracterizada por movimentos breves, repentinos, inoportunos e não voluntários, irresistíveis, sem finalidade aparente e que envolvem qualquer grupo muscular do corpo.
Tanto podem ser vocais como motores.
Por vezes os tiques podem parecer voluntários e propositados, como por exemplo, o uso de gestos obscenos (copropraxia), ou a imitação de gestos de terceiros (ecopraxia). Podem ter um elemento auto-lesivo (em 5% dos casos).
Alguns tiques vocais incluem o uso de sílabas, palavras ou frases; podem ser a repetição dos próprios sons ou linguagem (palilália), dos sons ou palavras de terceiros (ecolália) ou uso de linguagem obscena, calúnias religiosas, racistas (coprolália). A coprolália, distingue-se do insulto propositado, por ser abrupta, e lhe faltar a acentuação observada nas interações insultuosas.
A sua manifestação varia ao longo do tempo em termos de frequência, intensidade, localização e tipo de expressão.
Com o aumento da idade, as crianças começam a reportar sensações (pressão, comichão, irritação, energia) que anunciam a ocorrência eminente de concretização do tique; ocorrendo alívio da tensão após a sua realização.
A sua apresentação pode variar de formas discretas a formas incapacitantes, dolorosas, humilhantes, com prejuízo na relação com os pares, na relação cuidador-criança e diminuição da qualidade de vida.
Pode ser associada frequentemente a Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção, a Perturbação Obsessivo Compulsiva, perturbações emocionais como Ansiedade e Depressão.
Circunstâncias específicas estão associadas a variação do sintoma. Estados emocionais de medo, stress, tensão, variações térmicas e excesso de estímulos externos podem levar a um aumento de frequência e intensidade. Distrações e ocupações que exijam concentração reduzem a expressão do sintoma.
Os tiques podem ser primários (sem causa estabelecida) ou secundários (quando aparecem no contexto de uma outra doença).
O aparecimento do sintoma está ligado a um desequilíbrio dos neurotransmissores das vias cerebrais que controlam os movimentos. Parece existir uma interação entre fatores genéticos, psicológicos e sociais.
Os tiques afetam 3 a 12% das crianças em qualquer fase do seu desenvolvimento.
O pico de intensidade ocorre geralmente entre os 10 e os 12 anos. A maior parte das vezes, o sintoma é autolimitado e a sua expressão diminui com o crescimento tanto em termos de frequência como de severidade, desaparecendo ao longo do primeiro ano.
O diagnóstico baseia-se na observação direta dos tiques. As gravações em vídeo podem ser importantes para ajudar a definir os padrões.
A abordagem chave nestes casos centra-se na compreensão e aceitação do sintoma, uma vez que este está para além do controlo da criança. É fundamental desfocar do sintoma. A crítica, a recriminação, a punição e comentários do género “já estás a ter outro tique” ou “está quieto” não ajudam a controlar os tiques e podem contribuir para problemas emocionais e aumentar o stress.
Quando há interferência significativa nas rotinas escolares, familiares, sociais e relacionadas com o desenvolvimento (por exemplo vitimização, isolamento, conflitos interpessoais, alteração da performance académica, alteração da qualidade do sono), desconforto (lesões físicas, dor) poderá ser proposto um tratamento específico de acordo com as características individuais e necessidades da criança e família, assim como disponibilidade local. O tratamento farmacológico é puramente sintomático, devendo usar-se apenas quando a intensidade e frequência dos sintomas assim o justificam. Com o tratamento não é expectável a supressão dos tiques, mas a minimização do seu impacto.
Tiques são frequentes nas crianças. São movimentos involuntários, não controlados, não propositados e geralmente transitórios. É importante avaliar a necessidade de tratamento farmacológico segundo o seu impacto no desenvolvimento da criança e a interferência a nível emocional, relacional e social.